Regime jurídico do trabalho portuário - Decreto -Lei n.º 280/93
ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA
Republicação do Decreto -Lei n.º 280/93, de 13 de agosto
O presente diploma estabelece o regime jurídico do trabalho portuário
CAPÍTULO I Generalidades
Artigo 1.º - Âmbito
1 — O presente diploma estabelece o regime jurídico do trabalho portuário.
2 — Considera -se trabalho portuário, para efeitos do presente diploma, o prestado nas diversas tarefas de movimentação de cargas nas áreas portuárias de prestação de serviço público e nas áreas portuárias de serviço privativo, dentro da zona portuária.
3 — O disposto no presente diploma não é aplicável:
a) Ao trabalho prestado por trabalhadores das autoridades portuárias, nem ao dos trabalhadores que na zona portuária não se encontrem exclusiva ou predominantemente afetos à atividade de movimentação de cargas;
b) À movimentação de cargas em cais e terminais através da utilização de trailers ou veículos pesados de transporte de mercadorias;
c) Ao trabalho relativo à movimentação e arrumação de mercadorias em armazéns, bem como em parques e outras infraestruturas de plataformas logísticas constituídas ao abrigo da Lei n.º 152/2008, de 5 de agosto, ainda que integradas em zonas portuárias;
d) Ao controlo de entradas e saídas de mercadorias em portarias.
Artigo 2.º - Definições
Para efeitos deste diploma, entende -se por:
a) «Efetivo dos portos», o conjunto de trabalhadores que, possuindo aptidões e qualificação profissional adequadas ao exercício da profissão, desenvolvem a sua atividade profissional na movimentação de cargas, ao abrigo de um contrato de trabalho;
b) «Atividade de movimentação de cargas», a atividade de estiva, desestiva, conferência, carga, descarga, transbordo, movimentação e arrumação de mercadorias em cais, parques e terminais;
c) «Empresa de trabalho portuário», a pessoa coletiva cuja atividade consiste exclusivamente na cedência de trabalhadores qualificados para o exercício das diferentes tarefas portuárias de movimentação de cargas;
d) «Zona portuária», o espaço situado dentro dos limites da área de jurisdição das autoridades portuárias, constituído, designadamente, por planos de água, canais de acesso, molhes e obras de proteção, cais, terminais, terraplenos e quaisquer terrenos, armazéns e outras instalações;
e) «Áreas portuárias de prestação de serviço público», as áreas dominiais situadas na zona portuária e as instalações nela implantadas, pertencentes ou submetidas à jurisdição da autoridade portuária e por ela mantidas ou objeto de concessão de serviço público, nas quais se realizam operações de movimentação de cargas, em regime de serviço público;
f) «Áreas portuárias de serviço privativo», as áreas situadas na zona portuária e as instalações nelas implantadas que sejam objeto de direitos de uso privativo de parcelas de domínio público sob a jurisdição da autoridade portuária, nas quais se realizam operações de movimentação de cargas, exclusivamente destinadas ou com origem no próprio estabelecimento industrial e que se enquadram no exercício normal da atividade prevista no título de uso privativo;
g) «Serviço público de movimentação de cargas», aquele que é prestado a terceiros por empresa devidamente licenciada para o efeito, com fins comerciais, na zona portuária;
h) «Autoridade portuária», as administrações portuárias e as juntas autónomas dos portos, a quem está cometida a administração e a responsabilidade pelo funcionamento dos portos nacionais.
Artigo 3.º - Regime das relações de trabalho
Às relações entre o trabalhador que desenvolve a sua atividade profissional na movimentação de cargas e as empresas de estiva, as empresas de trabalho portuário e as empresas que explorem áreas de serviço privativo é aplicável o disposto no presente diploma, no Código do Trabalho e demais legislação complementar.
Artigo 4.º - Organização do trabalho portuário
1 — Na organização e prestação do trabalho portuário as entidades empregadoras e utilizadoras de trabalho portuário devem ter em conta as exigências de qualidade, produtividade e continuidade do serviço prestado aos utentes dos portos, bem como os interesses da economia e abastecimento nacional e o princípio da livre circulação de pessoas e mercadorias.
2 — A organização do trabalho nas operações portuárias só pode ser sujeita aos limites ou contingentes admitidos por lei.
CAPÍTULO II Contratos de trabalho portuário
Artigo 5.º - Carteira profissional
(Revogado.)
Artigo 6.º - Formação e qualificação profissional
1 — O trabalhador que desenvolve a sua atividade profissional na movimentação de cargas deve receber periodicamente da respetiva entidade empregadora a formação profissional necessária ao desempenho correto e em segurança das suas funções, a ministrar por entidades certificadas.
2 — Para efeitos de cumprimento do disposto no número anterior, a entidade empregadora deve assegurar ao trabalhador:
a) Formação inicial no momento do ingresso no mercado do trabalho portuário;
b) Formação profissional periódica visando a atualização de conhecimentos, sem prejuízo do direito individual à formação contínua prevista no artigo 131.º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro.
3 — Constitui contraordenação grave a violação do disposto nos números anteriores.
Artigo 6.º -A - Proteção da saúde e segurança no trabalho
1 — É aplicável à atividade de movimentação de cargas o regime jurídico da promoção da segurança e saúde no trabalho, aprovado pela Lei n.º 102/2009, de 10 de setembro, sem prejuízo do disposto nos números seguintes.
2 — A entidade empregadora deve assegurar ao trabalhador condições de saúde e segurança em todos os aspetos relacionados com a atividade de movimentação de cargas, nomeadamente no plano da instalação e manutenção da sinalização de segurança nas áreas portuárias.
3 — Sem prejuízo da formação prevista no artigo 6.º do presente diploma, a entidade empregadora deve assegurar ao trabalhador uma formação adequada no domínio da segurança e saúde no trabalho.
4 — Constitui contraordenação grave a violação do disposto nos n.os 2 e 3.
Artigo 7.º - Regime especial do trabalho portuário
1 — É aplicável à atividade de movimentação de cargas o disposto no artigo 142.º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, não podendo a duração total de contratos de trabalho a termo de muito curta duração celebrados com o mesmo empregador para a atividade de movimentação de cargas exceder 120 dias de trabalho no ano civil.
2 — O contrato de trabalho a termo para movimentação de cargas pode ser celebrado por prazo inferior a seis meses, desde que a sua duração não seja inferior à prevista para a tarefa ou serviço a realizar.
3 — O contrato de trabalho a termo celebrado para movimentação de cargas não tem limite de renovações, não podendo, no entanto, a sua duração exceder três anos.
4 — É admitida a prestação de trabalho de movimentação de cargas na modalidade de trabalho intermitente.
5 — Para os efeitos previstos no número anterior, o empregador deve informar o trabalhador do início de cada período de prestação de trabalho com a antecedência de 10 dias, podendo em instrumento de regulamentação coletiva de trabalho ser acordado um prazo inferior.
6 — A prestação do trabalho portuário suplementar só pode ser feita até ao limite máximo de 250 horas anuais.
7 — O limite máximo referido no número anterior pode ser afastado por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho quando a adoção de outro regime contratual de trabalho suplementar ou de outro limite máximo melhor se harmonizem com a adoção e implementação de outras disposições sobre utilização, contratação e remuneração de pessoal que favoreçam a eficiência e competitividade do respetivo porto.
8 — O afastamento do limite máximo previsto no número anterior depende de homologação pelos membros do Governo responsáveis pelas áreas dos transportes e laboral, sob parecer favorável do Instituto da Mobilidade e dos Transportes, I. P. (IMT, I. P.), relativo à verificação das respetivas condições.
CAPÍTULO III Empresas de trabalho portuário
Artigo 8.º - Licenciamento
1 — O exercício da atividade de cedência de trabalhadores para a realização de operações portuárias depende de licenciamento.
2 — O licenciamento das empresas de trabalho portuário é da competência do IMT, I. P., e será atribuído de acordo com o procedimento fixado por portaria do membro do Governo responsável pela área dos transportes.
Artigo 9.º - Empresas de trabalho portuário
1 — Podem requerer a licença referida no artigo anterior as pessoas coletivas de direito privado constituídas sob forma de associação, de cooperativa ou de sociedade comercial, cujo objeto social consista exclusivamente na cedência temporária de trabalhadores portuários.
2 — A concessão de licença depende do preenchimento dos requisitos de natureza técnica, económica e financeira, a estabelecer por decreto regulamentar.
3 — Aplica -se subsidiariamente à atividade das empresas referidas nos números anteriores o disposto no Decreto- -Lei n.º 358/89, de 17 de outubro.
4 — As empresas de trabalho portuário podem ceder trabalhadores que para esse efeito tenham contratado diretamente ou, nos termos a definir em instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho, com recurso a relações contratuais celebradas com empresas de trabalho temporário, não constituindo esta relação cedência ilícita tal como prevista no n.º 2 do artigo 173.º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro.
5 — Podem solicitar a concessão de licença, nos termos do n.º 1, as empresas que hajam iniciado o respetivo processo de constituição, caso em que a licença só poderá ser concedida a título provisório, pelo período de 180 dias.
Artigo 10.º - Registo de empresas
1 — O IMT, I. P., manterá atualizados os registos das empresas de trabalho portuário que atuam em cada porto.
2 — O registo referido no número anterior tem caráter público, podendo qualquer interessado pedir certidões das inscrições dele constantes.
3 — O licenciamento e a autorização referidos no artigo 8.º serão oficiosamente comunicados, no prazo de oito dias, pelo IMT, I. P., às autoridades portuárias, para efeitos de registo.
CAPÍTULO IV Transição de regimes
Artigo 11.º - Transição de regimes anteriores
1 — São extintos, sem prejuízo dos direitos garantidos por este diploma, os regimes de inscrição e de exclusivo dos trabalhadores portuários inscritos, bem como os contingentes dos portos, criados nos termos da legislação anteriormente vigente em matéria de trabalho portuário, designadamente do artigo 25.º do Decreto -Lei n.º 151/90, de 15 de maio.
2 — Aos trabalhadores portuários inscritos no contingente dos diversos portos é reconhecida, sem qualquer formalidade, a integração no efetivo portuário nacional.
Artigo 12.º - Transformação dos organismos de gestão de mão -de -obra portuária
1 — Os organismos de gestão de mão -de -obra portuária e as demais entidades responsáveis pela gestão de mão -de -obra do contingente comum dos portos podem, nos nove meses subsequentes à entrada em vigor do presente diploma, transformar -se em empresas de trabalho portuário.
2 — A transformação referida no número anterior depende da adaptação do organismo em causa aos requisitos previstos no presente diploma e seus regulamentos, devendo o registo correspondente do ITP ser por ele requerido, depois de cumpridas todas as demais formalidades da transformação.
3 — Conservam o estatuto de utilidade pública, quando mantenham a forma associativa, as entidades referidas nos números anteriores que:
a) Absorvam trabalhadores oriundos do contingente comum criado ao abrigo da legislação anterior no porto em que se propõem operar, em número não inferior a um terço desse contingente;
b) Ofereçam especiais garantias em matéria de estabilidade de emprego e de cooperação com a administração na prossecução dos interesses e fins desta, nomeadamente no desenvolvimento e melhoria dos serviços portuários.
Artigo 13.º - Título contratual dos trabalhadores oriundos do contingente comum
1 — Os trabalhadores que, à data de entrada em vigor do presente diploma, se encontrem inscritos num organismo de gestão de mão -de -obra portuária regularmente constituído e registados no ITP, quando pertençam ao contingente comum do porto, são considerados, para todos os efeitos legais, vinculados àquele organismo por contrato de trabalho sem termo.
2 — A antiguidade dos contratos a que se refere o número anterior reporta -se à data da primeira inscrição do trabalhador no contingente de qualquer porto.
Artigo 14.º - Direito de opção dos trabalhadores dos quadros de empresas de operação portuária
1 — Os trabalhadores portuários que se encontrem, à data da entrada em vigor do presente diploma, vinculados por contrato de trabalho sem termo aos quadros privativos de uma empresa de operação portuária, ao abrigo do artigo 33.º do Decreto -Lei n.º 151/90, de 15 de maio, podem optar pela manutenção na referida situação ou pelo ingresso nos quadros do organismo de gestão de mão -de -obra existente no respetivo porto, mantendo a antiguidade decorrente da sua posição contratual anterior com a categoria de trabalhador portuário de base.
2 — A opção pelo ingresso nos quadros do organismo referidos no número anterior depende de comunicação assinada e reconhecida, por qualquer meio legal, como sendo do próprio trabalhador, dirigida a esse organismo e com conhecimento simultâneo, por duplicado, ao ITP e à entidade empregadora, a qual produz todos os seus efeitos, quer em relação àquele organismo, quer em relação a esta entidade, no 1.º dia do 2.º mês subsequente àquela comunicação e conhecimento.
3 — O direito de opção dos trabalhadores abrangidos pelo n.º 1 deve ser exercido, sob pena de caducidade, dentro do prazo de três meses contados da data de entrada em vigor do presente diploma.
Artigo 15.º - Antiguidade dos trabalhadores oriundos do contingente comum
Os trabalhadores oriundos dos organismos de gestão de mão -de -obra portuária que sejam contratados por empresas de trabalho portuário ou por qualquer outro empregador que realize operações portuárias mantêm, para efeitos de reforma, a antiguidade da respetiva inscrição.
CAPÍTULO V Regime das contraordenações
Artigo 16.º - Regime das contraordenações
1 — O regime geral das contraordenações laborais previsto nos artigos 548.º a 566.º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, aplica -se às infrações por violação do presente diploma.
2 — O processamento das contraordenações laborais segue o regime processual previsto na Lei n.º 107/2009, de 14 de setembro, competindo ao serviço com competência inspetiva do ministério responsável pela área laboral a instrução dos respetivos processos.
3 — Sem prejuízo dos números anteriores, às infrações por violação do presente diploma no que respeita ao licenciamento, registo e autorizações das empresas de trabalho portuário é aplicável o regime geral das contraordenações, competindo ao serviço com competência inspetiva do ministério responsável pela área dos transportes a instrução dos respetivos processos.
4 — A tentativa e a negligência são puníveis, sendo, nesse caso, reduzidos para metade os limites mínimos e máximos das coimas.
Artigo 17.º - Exercício de atividade de empresa de trabalho portuário por entidade não licenciada
1 — O exercício da atividade de empresa de trabalho portuário por entidade não licenciada constitui contraordenação, punível com coima variável em função do volume de negócios da empresa e do grau da culpa do infrator.
2 — Os limites mínimo e máximo das coimas correspondentes são os seguintes:
a) Se praticada por empresa com volume de negócios inferior a € 500 000, de 20 unidades de conta processual (UC) a 40 UC em caso de negligência e de 45 UC a 95 UC em caso de dolo;
b) Se praticada por empresa com volume de negócios igual ou superior a € 500 000 e inferior a € 2 500 000, de 32 UC a 80 UC em caso de negligência e de 85 UC a 190 UC em caso de dolo;
c) Se praticada por empresa com volume de negócios igual ou superior a € 2 500 000 e inferior a € 5 000 000, de 42 UC a 120 UC em caso de negligência e de 120 UC a 280 UC em caso de dolo;
d) Se praticada por empresa com volume de negócios igual ou superior a € 5 000 000 e inferior a € 10 000 000, de 55 UC a 140 UC em caso de negligência e de 145 UC a 400 UC em caso de dolo;
e) Se praticada por empresa com volume de negócios igual ou superior a € 10 000 000, de 90 UC a 300 UC em caso de negligência e de 300 UC a 600 UC em caso de dolo.
3 — O volume de negócios reporta -se ao ano civil anterior ao da prática da infração.
4 — Caso a empresa não tenha atividade no ano civil anterior ao da prática da infração, considera -se o volume de negócios do ano mais recente.
5 — No ano de início de atividade são aplicáveis os limites previstos para empresa com volume de negócios inferior a € 500 000.
6 — Se o empregador não indicar o volume de negócios, aplicam -se os limites previstos para empresa com volume de negócios igual ou superior a € 10 000 000.
Artigo 18.º - Sanções acessórias
1 — Para além das sanções acessórias previstas no Código do Trabalho, o exercício da atividade de empresa de trabalho portuário por entidade não licenciada é ainda punível com ordem de encerramento do estabelecimento onde a atividade é exercida até à regularização da situação, juntamente com a coima.
2 — As sanções acessórias referidas no número anterior são averbadas no registo referido no artigo 10.º
Artigo 19.º - Destino das coimas
1 — Nos processos cuja instrução esteja cometida ao serviço com competência inspetiva do ministério responsável pela área dos transportes, o produto da coima será repartido de acordo com as seguintes proporções:
a) 20 % para o serviço com competência inspetiva do ministério responsável pela área dos transportes;
b) 20 % para a autoridade portuária;
c) 60 % para o Estado.
2 — O serviço com competência inspetiva do ministério responsável pela área dos transportes transfere trimestralmente para as entidades referidas no número anterior as importâncias a que têm direito.
Artigo 20.º - Sanção acessória
(Revogado.)
Artigo 21.º - Destino das coimas
(Revogado.)
CAPÍTULO VI Disposições finais
Artigo 22.º - Medidas complementares
(Revogado.)
Artigo 23.º - Processos
(Revogado.)
Artigo 24.º - Revogação expressa
São revogados:
a) Os artigos 17.º a 20.º do Decreto -Lei n.º 282 -C/84, de 20 de agosto;
b) Os Decretos -Leis n.os 151/90, de 15 de maio, e 357/91, de 20 de setembro;
c) As Portarias n.os 481/90, de 28 de junho, 580/90, de
21 de junho, e 1037/91, de 9 de outubro.
Artigo 25.º - Entrada em vigor
O presente diploma entra em vigor em 1 de novembro de 1993.
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