49. Os pedidos vêm sustentados, em síntese, nas seguintes razões:
a) O artigo 75.° da LOE 2014 impõe que nas empresas do setor público empresarial que tenham apresentado resultados líquidos negativos nos três últimos exercícios apurados apenas seja permitido o pagamento de complementos às pensões atribuídas pelo Sistema Previdencial da Segurança Social, pela CGA ou por outro sistema de proteção social, nos casos em que aqueles complementos sejam integralmente financiados pelas contribuições ou quotizações dos trabalhadores, através de fundos especiais ou outros regimes complementares;
b) Trata-se de uma conditio impossibilis, dada a fáctica inexistência de tais fundos em diversos casos, notória e documentável, acoplada, no tocante à delimitação do âmbito de aplicação temporal, por outra condição (a reposição do equilíbrio financeiro das empresas do setor público empresarial, após a verificação de três anos consecutivos de resultados líquidos positivos) cuja verificação é impossível face à esperança de vida dos trabalhadores afetados;
c) Pelo que o alcance das normas é, pura e simplesmente, a ablação unilateral pelo Estado de montantes negociados e devidos;
d) Os complementos de reforma surgem na sequência de negociação de reformas antecipadas em empresas, com a respetiva penalização, sendo que os trabalhadores abrangidos não teriam feito essa opção e teriam preferido aguardar pelo fim das respetivas carreiras contributivas, se tivessem a mínima suspeita de que no seu horizonte de vida alguma medida legislativa pudesse vir a alterar negativamente o quadro legal em que fez assentar as suas expetativas;
e) As expetativas de continuidade eram absolutas, legítimas, justificadas e fundadas em boas razões e todos os trabalhadores nessa situação traçaram os seus planos de vida baseados na convicção da continuidade do comportamento estadual;
f) As normas do artigo 75.° da LOE 2014 contêm soluções legislativas manifestamente assistemáticas e desenquadradas de qualquer esforço global de sustentabilidade do sistema público de proteção social e de repartição intergeracional e intrageracional, merecendo por isso o mesmo destino que as normas que estiveram em apreciação no acórdão n.º 862/2013 desse Tribunal, isto é, a declaração de inconstitucionalidade por violação do princípio da proteção da confiança;
g) Mas, para além disso, aquelas normas do artigo 75.º da LOE 2014 violam também o princípio da igualdade. Visivelmente, o legislador isolou categorias ou classes específicas de pensionistas, com apenas algumas dezenas ou poucas centenas de pessoas e introduziu diferenciações que nem sequer parecem ter um fundamento racional, desse modo violando a versão mais elementar do princípio geral da igualdade como proibição do arbítrio;
h) Designadamente, a norma prevista no n.º 3 do artigo 75.º da LOE 2014 tem consequências demolidoras para os trabalhadores já reformados e pensionistas do Metropolitano de Lisboa e Carris, conduzindo, pelo menos ao nível do Metropolitano de Lisboa, a cortes no valor total bruto da pensão recebida que pode ultrapassar os 60%;
i) Ora, é inequívoco que é o Estado que define os objetivos das empresas do setor público empresarial e que condiciona/aprova a política tarifária, no entendimento, partilhado por todos os governos, de que as tarifas praticadas em redes urbanas de grandes cidades têm sempre uma componente social que não permite cobrir os custos de produção do transporte;
j) Por conseguinte, a existência de resultados líquidos negativos não é imputável aos trabalhadores ou aos ex-trabalhadores, que nada poderiam fazer para que eles fossem ou deixassem de ser negativos. Nesse contexto, escolher como “razão” ou critério da diferenciação entre grupos de pensionistas a circunstância da existência ou não de resultados líquidos negativos da respetiva empresa torna a medida completamente arbitrária e remete-a para o domínio da irracionalidade;
l) As normas do artigo 75.° da LOE 2014 violam também o princípio da proporcionalidade. Desde logo porque, conforme se alegou a propósito do artigo 33.º, o próprio legislador, pelos seus comportamentos noutras zonas da política orçamental, mostra que existe margem para medidas alternativas menos drásticas para estas categorias específicas de beneficiários da proteção social. Consequentemente, há violação do segmento da necessidade;
m) O número de trabalhadores afetados pelas medidas em apreço não permite que se considere que está aqui em causa o cumprimento dos acordos internacionais que têm servido de justificação às medidas penalizadoras dos rendimentos do trabalho e das pensões, nem assumem qualquer dimensão digna de nota quanto à sustentabilidade da Segurança Social. Não se trata manifestamente de uma medida idónea, indispensável, ou proporcional;
n) E há também violação do segmento da proporcionalidade em sentido estrito, uma vez que o sacrifício imposto, particularmente quando analisado pelo ângulo individual de cada uma das pessoas atingidas, é de tal forma intenso que não é justificado pela obtenção de ganhos de consolidação orçamental manifestamente escassos;
o) Segundo o n.° 7 do artigo 75.°, o regime fixado tem natureza imperativa, enquanto se verificarem as condições nele estabelecidas, prevalecendo sobre contratos de trabalho ou instrumentos de regulação coletiva de trabalho e quaisquer outras normas legais, especiais ou excecionais, em contrário, não podendo ser afastado ou modificado pelas mesmas. É assim posto em causa o direito de contratação coletiva (artigo 56.°, n.° 3, da Constituição), na medida em que são revogadas normas livremente acordadas entre as partes e é afastada a possibilidade de negociações futuras sobre a matéria.
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