DECLARAÇÃO DE VOTO
Fiquei vencido quanto à alínea d) da decisão, pois entendo que as normas do artigo 75.º, referente a complementos de pensão, violam o artigo 56.º, n.º 3, da Constituição e, em conexão, o princípio da proteção da confiança.
Quanto ao primeiro, as razões são substancialmente as mesmas que expendi no ponto 3 da declaração que emiti no Acórdão n.º 602/2013. Como aí se disse, colocar os efeitos vinculativos de uma convenção coletiva de trabalho, «sob condição resolutiva imprópria de livre revogação [ou suspensão] por lei posterior é destruir a garantia institucional que o reconhecimento constitucional do direito à contratação coletiva subentende». Está em causa a violação, pelo legislador, do dever de respeitar os efeitos normativos resultantes de um anterior exercício da autonomia coletiva. Por isso, passam ao lado da questão todas as considerações, apoiadas no Acórdão n.º 517/98, que intentam demonstrar que a matéria dos complementos de pensão está fora do conteúdo essencial ou da reserva de contratação coletiva. Essa colocação do problema é falseadora da sua natureza, pois não está em causa a matéria regulada, mas antes a perduração da eficácia de uma anterior regulação. Para este efeito, basta que a matéria seja objeto possível de contratação coletiva, não se requerendo que seja reservada a convenção coletiva de trabalho ou de regulação necessária por este instrumento. E se há qualquer dúvida quanto à validade dos acordos coletivos, a questão é para ser dirimida na esfera judicial e não pelo exercício do poder legislativo.
Sobretudo no que diz respeito aos trabalhadores que já beneficiam dos complementos de pensão, a destruição da garantia que uma convenção coletiva disponibiliza representa também uma lesão particularmente grave da confiança legitimamente depositada na aplicação do regime acordado. Com a passagem à reforma, os trabalhadores tornam-se titulares do direito de crédito às prestações correspondentes aos complementos de pensão, o que outra coisa não significa, para o que aqui interessa, do que o direito a confiar que elas lhes serão pagas. A intervenção do legislador retira-lhes (pelo menos temporariamente) esse direito, numa fase em que esses trabalhadores já não estão em condições de ajustar a sua conduta ao novo quadro legal, ficando definitivamente presos a opções tomadas no passado, por investimento na confiança, agora irremediavelmente frustrado. E nem se diga, como argumenta o Acórdão, que foram as empresas e não o Estado a celebrar os acordos coletivos, pelo que não pode ser imputada ao Estado a criação de uma situação de confiança. A promiscuidade, existente no passado, entre as empresas públicas do tipo das envolvidas e o Estado-Administração não autoriza semelhante separação, no quadro da tutela constitucional da confiança, legitimando, pelo contrário, a “desconsideração da personalidade jurídica” das entidades empresariais outorgantes.
Joaquim de Sousa Ribeiro
45.
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