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Regras de progressão e promoção - Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo n.º 6/2012

SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo n.º 6/2012 de 20 de setembro

Processo n.º 369/12 — Pleno da 1.ª Secção

Acordam no Pleno da 1.ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo:

O Sindicato dos Trabalhadores dos Impostos interpôs este recurso para uniformização de jurisprudência com o fundamento de que a decisão recorrida — o aresto proferido pelo TCA -Sul e constante de fls. 262 a 266 dos autos — está em contradição, quanto a idêntica questão fundamental de direito, com o acórdão do mesmo TCA, proferido em 12 de Maio de 2011 no processo n.º 6686/10.

O recorrente terminou a sua alegação de recurso formulando as conclusões seguintes:

1 — Atenta a identidade dos factos, assim como das normas de direito que lhes são aplicáveis, existe contradição de julgados entre o acórdão proferido nos presentes autos e o acórdão proferido no processo n.º 6686/10 (2.º Juízo — 1.ª Secção), em 12 de Maio de 2001, pelo TCA -Sul.

2 — Atenta a incongruência de decisões proferidas sobre a mesma matéria de facto e de direito, importa proferir decisão que uniformize a jurisprudência sobre o assunto. Contra -alegou o Ministério das Finanças e da Administração Pública, concluindo pela forma seguinte:

1 — A uniformização de jurisprudência deve respeitar a decisão contida no acórdão impugnado, já que este fez uma correcta interpretação e aplicação da lei aos factos.

2 — Por esse motivo, não pode ser reconhecido ao recorrente o direito ao posicionamento, pelo menos igual aos de outros funcionários com menor antiguidade na categoria, mas em índice superior.

3 — Não deve ser acolhido o entendimento propugnado no acórdão fundamento, que incide sobre a questão factual da inversão de posições remuneratórias, omitindo a própria estrutura do sistema retributivo que assenta em princípios que admitem essa possibilidade.

4 — Essa admissão foi já expressamente defendida pelo Tribunal Constitucional, através do acórdão proferido no processo n.º 323/05, a cuja posição o acórdão impugnado adere.

5 — O acórdão impugnado toma em consideração a estrutura do sistema retributivo e os princípios de acordo com os quais a progressão e promoção nas carreiras ocorrem e a que o Decreto -Lei n.º 557/99, de 17 de Dezembro, obedece.

6 — Entende o Tribunal Constitucional, que na questão da inversão de posições remuneratórias, só ocorre a violação do princípio constitucional «para trabalho igual salário igual», quando se verifica o recebimento de remuneração superior por funcionários que, cumulativamente, detenha menor antiguidade na categoria e na carreira.

7 — No presente caso o acórdão impugnado decidiu bem, porque não se verificam ambas as condições, logo não existe desigualdade que imponha o reposicionamento do funcionário.

8 — Com efeito, no caso presente, tal como veio alegado e provado, apenas estão em causa colegas com menor antiguidade na categoria, mas nada se diz quanto à antiguidade na carreira.

9 — E esta diferença é possível, na medida em que a articulação das regras da progressão na carreira conjugadas com as regras da progressão na carreira, podem implicar diferenças remuneratórias entre funcionários, de modo a que funcionários com menos tempo na categoria aufiram uma retribuição maior.

10 — O acórdão impugnado entende, tal como entende o Tribunal Constitucional, que não é apenas pela razão de existirem diferenças entre funcionários na mesma categoria, que se pode configurar a existência de uma desigualdade que viole a Lei Fundamental.

11 — O que temos aqui em causa, é precisamente uma diferença de remuneração que assenta em critérios objectivos, e é por isso inteiramente justificada pela própria natureza do sistema, que permite que existam diferenças de remuneração a ponto de, numa mesma categoria, funcionários com mais tempo recebam remunerações inferiores.

12 — Não é suficiente para que se conclua pela verificação de uma violação dos princípios da igualdade ou da equidade o facto de um funcionário mais antigo na categoria ser remunerado por um índice inferior ao de outro menos antigo.

13 — Não estando vedada a promoção aos funcionários que não tenham atingido o último escalão da categoria imediatamente anterior, são inevitáveis as diferenças remuneratórias entre funcionários dentro da mesma categoria.

14 — O acórdão impugnado decidiu em conformidade com a jurisprudência do Tribunal Constitucional sobre esta matéria, que entende que apenas são lesivas do princípio constitucional «para trabalho igual salário igual», situações que conduzem ao recebimento de remuneração superior por funcionários que, cumulativamente, detenham menor antiguidade na categoria e na carreira.

15 — A uniformização de jurisprudência deverá ser feita no sentido de respeitar o acórdão impugnado, porque estão em total adesão àquilo que foi decidido, em matéria semelhante, pelo Tribunal Constitucional.

16 — Ficou provado que a situação profissional do representado do recorrente advém da conjugação das regras gerais de transição previstas no novo estatuto de pessoal e regime de carreiras da DGCI, aprovado pelo Decreto -Lei n.º 557/99, de 17 de Dezembro.

17 — Por isso não existe qualquer violação do princípio da igualdade sancionada pelo acórdão impugnado, cujo entendimento deve prevalecer.

18 — Deve por isso manter -se no ordenamento jurídico, tal e qual como foi proferido, o despacho datado de 15 de Dezembro de 2008 que indeferiu, por falta de fundamento legal, o pedido de reposicionamento em diferente escalão da escala salarial da categoria de técnico de administração tributária (TAT), com fundamento no facto de colegas com menos antiguidade na mesma categoria vencerem por índice superior ao seu, ficando numa situação retributiva superior.

19 — E indeferir -se o pedido de condenação à prática do acto legalmente devido, que proceda ao reposicionamento do representado do recorrente, por forma a vencer por escalão (3) e índice (720) superior ao dos colegas nomeados posteriormente, dada a maior antiguidade daquele na categoria, em obediência ao princípio constante do artigo 14.º, n.º 1, do Decreto -Lei n.º 184/89, de 2 de Junho, e dos princípios constitucionais supracitados, maxime os emergentes dos artigos 13.º e 59.º da CRP.

A matéria de facto pertinente é a dada como provada no acórdão recorrido, que aqui se dá por inteiramente reproduzida — como genérica e ultimamente decorre do estatuído no artigo 713.º, n.º 6, do CPC.

Passemos ao direito.

Na acção destes autos, o Sindicato dos Trabalhadores dos Impostos pediu a condenação do Ministério das Finanças e da Administração Pública a reposicionar um seu associado — que, em 26 de Setembro de 2005, fora promovido à categoria de técnico de administração tributária (TAT), nível 2, vencendo pelo índice 690, que corresponde ao 2.º escalão — no 4.º escalão, índice 735, dessa categoria, com efeitos reportados a 8 de Fevereiro de 2007, sendo esta a data em que vários colegas desse TAT foram promovidos à mesma categoria e posicionados no seu

3.º escalão, índice 720. E o autor fundou o seu pedido nos princípios da igualdade, da justiça e da equidade interna, por um lado, e na aplicação extensiva do artigo 21.º, n.º 4, do Decreto -Lei n.º 404 -A/98, de 18 de Setembro, por outro, já que esses princípios e norma impediriam que o associado do autor — apesar do que se dispõe no Decreto -Lei n.º 557/99, de 17 de Dezembro — pudesse ganhar menos, ou sequer o mesmo, do que colegas com menor antiguidade na categoria comum.

A acção foi julgada improcedente na 1.ª instância. E o aresto recorrido confirmou essa sentença, afirmando que a maior antiguidade, só na categoria, do associado do sindicato autor relativamente a tais colegas não é razão bastante para que se tenham por violados os sobreditos princípios.

Por sua vez, o acórdão fundamento apreciou uma situação equivalente à destes autos, pois o mesmo sindicato representara aí um associado também posicionado como TAT, nível 2, e integrado no 2.º escalão, índice 690, que almejava o seu reposicionamento por constatar que colegas depois promovidos à mesma categoria foram integrados no seu 3.º escalão, índice 720. E tal aresto entendeu que «essas soluções remuneratórias desiguais» eram inaceitáveis à luz dos «objectivos indicados» no preâmbulo do Decreto- -Lei n.º 557/99, de 17 de Dezembro, e dos princípios da equidade interna do sistema retributivo, da justiça e da igualdade; de modo que várias normas daquele Decreto -Lei n.º 557/99 deviam ser desaplicadas e a pretensão formulada «in initio litis» tinha de proceder.

Perante isto, é evidente que os acórdãos recorrido e fundamento mutuamente se opõem: é que o primeiro disse que um TAT, nível 2, mais antigo na categoria, pode estar, «secundum legem», posicionado num escalão inferior àquele a que outrem acedeu ao ter sido promovido à mesma categoria; enquanto o acórdão fundamento asseverou o contrário.

Assim, e porque também se verificam os demais requisitos da admissibilidade deste recurso para uniformização de jurisprudência («vide» o artigo 152.º do CPTA), há que conhecer do respectivo mérito.

Está em causa o modo de aplicação do Decreto -Lei n.º 557/99, de 17 de Dezembro, que redefiniu o regime de carreiras dos funcionários da DGCI, em que se integra o grupo de pessoal da administração tributária designado por GAT (artigo 1.º). Nos termos do artigo 26.º do mesmo diploma, o pessoal das carreiras do GAT, previstas no anexo III, distribui -se por categorias, graus e níveis (n.º 1); e estes últimos identificam as diferentes escalas indiciárias dentro de uma mesma categoria (n.º 4).

Segundo o artigo 43.º do Decreto -Lei n.º 557/99, tais escalas indiciárias são as constantes do mapa V anexo. E aí vêem -se duas coisas: que as duas categorias que ora nos importam — a de TAT, nível 2, em que se posicionaram o associado do autor (e aqui recorrente) e os colegas com que ele está comparado, e a categoria imediatamente anterior, de TAT, nível 1 — se desenvolvem em cinco escalões, a que correspondem diferentes índices remuneratórios; e que os índices dos dois últimos escalões da categoria de TAT, nível 1 — os índices 655 e 695 — superam os índices 650 ou 690, correspondentes aos dois primeiros escalões da categoria de TAT, nível 2.

Ora, as regras de promoção e progressão nas carreiras do GAT constam do artigo 44.º do diploma referido. E essas regras são, basicamente, três. Em princípio, a promoção faz -se para o 1.º escalão da categoria de promoção. Mas, se o funcionário já auferia remuneração igual ou superior à desse escalão, a promoção faz -se para o índice superior mais aproximado, embora se garanta sempre um impulso salarial mínimo de 10 pontos («ex vi» do artigo 17.º, n.º 2, do Decreto -Lei n.º 353 -A/89, de 16 de Outubro). E a regra anterior pode ainda ceder se a remuneração devida pela normal progressão na escala salarial da categoria «a quo» fosse superior à resultante da promoção, hipótese em que esta se faz «para o escalão a que corresponda o mesmo índice do escalão de progressão ou para o escalão imediatamente superior se não houver coincidência de índice».

Estas regras foram indiscutivelmente aplicadas ao associado do sindicato recorrente. Com efeito, este tinha a categoria de TAT, nível 1, e progrediu em 2003 ao 3.º escalão dessa categoria, com o índice 615. Assim, quando ele, em 26 de Setembro de 2005, foi promovido à categoria de TAT, nível 2, resultaria da 1.ª regra, «supra» referida, o seu posicionamento no 1.º escalão, índice 650, da categoria «ad quem». Mas, por causa da 3.ª regra — e dado que o índice do 4.º escalão da categoria de TAT, nível 1, excedia aquele índice 650 — ele foi então posicionado no 2.º escalão da categoria, com o índice 690.

Portanto, o posicionamento do associado do recorrente operou -se «secundum legem» — facto que, aliás, nos autos se não contesta. Aliás, também aí se não afirma que os colegas dele hajam acedido erroneamente ao índice 720 da categoria de TAT, nível 2. Ao invés, a acção dos autos arranca do pressuposto que tal posicionamento deles foi correcto — o que nos parece certo em face dos elementos disponíveis e das normas já citadas. E, no fundo, tudo isto mostra que o sindicato recorrente, ao pretender «in casu» um reposicionamento do seu associado a partir do posicionamento irrepreensível de colegas seus, discorda do sistema de progressão e promoção instituído pelo Decreto- -Lei n.º 557/99.

Não se trata de uma discordância global. O sindicato aceita de bom grado o sistema na medida em que ele proporciona incrementos remuneratórios — designadamente a propulsão de 85 pontos de que o associado do recorrente beneficiou ao ser promovido a TAT, nível 2. Mas, e para além disso, o sindicato almeja «melhorar» («ut sibi placet») o mecanismo desenhado na lei, introduzindo -lhe uma nova regra de progressão automática — segundo a qual todos os funcionários do GAT progrediriam ao escalão seguinte àquele em que fossem posicionados os funcionários entretanto promovidos à mesma categoria.

Mas já vimos que esta desejada regra não consta do artigo 44.º do Decreto -Lei n.º 557/99 — e é, por isso, ilegal. Aliás, tal ilegalidade não se esvai mediante uma suposta aplicação extensiva do artigo 21.º, n.º 4, do Decreto -Lei n.º 404 -A/98, de 18 de Dezembro, e isto por dois motivos: «primo», porque esta norma só se aplica ao «regime geral», não podendo prevalecer sobre o preceito especial ínsito naquele artigo 44.º; «secundo», porque esse artigo 21.º, n.º 4, referia -se a promoções ocorridas ou possíveis nos anos de 1997 e 1998, constituindo uma das «situações especiais» que a norma previa para aquele tempo e que são manifestamente intransponíveis para o caso dos autos.

Assim, dada a óbvia repugnância legal da regra que o sindicato recorrente preconiza e esgrime em prol do reposicionamento do seu associado, só seria possível fazê -la sobrepor ao artigo 44.º do Decreto -Lei n.º 557/99, de 17 de Dezembro, se este fosse inconstitucional por ofensa de quaisquer princípios jurídicos superiores. E é isso que o recorrente clama, insistindo que essa sua regra, justificativa do reposicionamento pedido, se sobrepõe à lei ordinária por razões de igualdade, justiça e equidade interna do sistema retributivo.

Mas não tem razão. A circunstância do sistema retributivo aplicável possibilitar que, aos últimos escalões de uma categoria, correspondam índices remuneratórios superiores aos dos primeiros escalões da categoria seguinte, porque explicada pelo critério da antiguidade na carreira, não fere a equidade interna do sistema. E também não se pode seguramente dizer que, à maior antiguidade na categoria, deva, por razões de igualdade ou justiça, corresponder maior remuneração; pois um dos correlatos da circunstância acima referida consiste, precisamente, na possibilidade dum funcionário mais novo na categoria, mas mais antigo na carreira, auferir por índice superior ao de um colega que acedera antes à mesma categoria. Ora, desde que o maior vencimento do funcionário mais novo na categoria se deva à sua maior antiguidade na carreira — ou, pelo menos, na categoria anterior — de imediato se esfuma a hipótese de tratar essa aparente discrepância nos planos da igualdade ou da justiça, já que essa diferença entre os funcionários em cotejo se justifica à luz das situações desiguais em que se encontravam no que concerne à antiguidade deles na carreira ou na categoria «a quo».

Portanto, a acção dos autos carece de base jurídica — juí zo este extensível à pronúncia a propósito emitida pelo acórdão fundamento. O acórdão recorrido, pelo contrário, decidiu com absoluta correcção, merecendo subsistir na ordem jurídica.

Assim, e demonstrada a improcedência ou a irrelevância das conclusões da alegação do recorrente, importa uniformizar a jurisprudência conflituante nos seguintes termos:

As regras de progressão e promoção insertas no artigo 44.º do Decreto -Lei n.º 557/99, de 17 de Dezembro, não consentem que os funcionários do GAT, perante a promoção posterior doutro funcionário à mesma categoria, sejam automaticamente reposicionados num escalão superior da categoria, designadamente no seguinte àquele em que esse outro funcionário fora posicionado.

Nestes termos, acordam em negar provimento ao presente recurso e em confirmar o acórdão recorrido.

Sem custas.

Publique -se (artigo 152.º, n.º 4, do CPTA).

Lisboa, 20 de Setembro de 2012. — Jorge Artur Madeira dos Santos (relator) — José Manuel da Silva Santos Botelho — Alberto Augusto Andrade de Oliveira — Rosendo Dias José — Américo Joaquim Pires Esteves — Luís Pais Borges — Alberto Acácio de Sá Costa Reis — Adérito da Conceição Salvador dos Santos — António Bernardino Peixoto Madureira — António Bento São Pedro — António Políbio Ferreira Henriques — Fernanda Martins Xavier e Nunes.